
Uma antiga cidade esquecida por milênios acaba de emergir das areias do tempo. Arqueólogos revelam a impressionante redescoberta da cidade de Imet, no leste do Delta do Nilo, e suas estruturas imponentes, segredos religiosos e arquitetura urbana sem precedentes.
A arqueologia egípcia foi novamente surpreendida por uma descoberta de proporções históricas. Pesquisadores escavando na região de Tell el-Fara’in, no delta oriental do rio Nilo, anunciaram ter localizado os restos de Imet, uma cidade perdida do Antigo Egito que por séculos permaneceu soterrada e fora do alcance da ciência. O achado não apenas reescreve parte da história egípcia, mas oferece novas perspectivas sobre a organização social, arquitetura urbana e espiritualidade no Egito Antigo, especialmente no período que antecede a dominação romana.
Onde foi encontrada a cidade perdida de Imet?
A cidade foi localizada na região conhecida como Tell el-Fara’in, no atual Delta do Nilo, uma área de extrema importância agrícola e estratégica no Antigo Egito. Utilizando imagens de satélite de alta resolução e técnicas modernas de sensoriamento remoto, arqueólogos foram capazes de identificar padrões anômalos na paisagem — aglomerados de tijolos de barro enterrados — que indicavam estruturas humanas. A partir disso, iniciou-se uma escavação sistemática que revelou construções surpreendentes.
Arquitetura surpreendente: casas-torre do Antigo Egito
Entre os achados mais impressionantes está a descoberta de casas-torre de vários andares, um estilo arquitetônico raro no Egito antigo. Essas construções, erguidas com paredes de fundação extremamente espessas, revelam uma sociedade com altos níveis de urbanização e engenharia. Segundo a professora Nicky Nielsen, da Universidade de Manchester, essas estruturas são típicas do Delta do Nilo entre o Período Tardio e a era romana, mas são quase inexistentes em outras regiões do Egito.
“A presença dessas casas-torre mostra que Imet era uma cidade densa, próspera e altamente desenvolvida para sua época”, afirmou Nielsen.
Essas construções indicam um nível de planejamento urbano avançado, sugerindo que Imet não era apenas uma cidade agrícola, mas um verdadeiro centro urbano com infraestrutura complexa, capaz de abrigar um grande número de habitantes em espaços verticais, algo incomum para o período.
Vida cotidiana e economia: centro de processamento de grãos
Outro ponto notável da descoberta foi a identificação de um centro de processamento de grãos, com áreas pavimentadas e espaços delimitados para o alojamento de animais. Essa estrutura indica uma economia local baseada tanto na agricultura quanto na pecuária, com capacidade para estocar e distribuir alimentos em larga escala.
O achado reforça a ideia de que Imet possuía uma posição estratégica dentro das rotas comerciais do Delta do Nilo. Estando no cruzamento de caminhos usados por comerciantes e peregrinos, a cidade funcionava como um hub econômico e espiritual, o que contribuiu para sua longevidade e importância regional.
Religião e espiritualidade: o culto à deusa Wadjet
Imet também era um importante centro religioso. Evidências encontradas durante as escavações revelaram uma profunda devoção à deusa Wadjet, uma divindade associada à proteção do Egito e comumente representada como uma cobra.
O templo de Wadjet foi reconstruído por dois grandes faraós: Ramsés II, por volta de 1200 a.C., e Ahmose II, em cerca de 500 a.C. No entanto, vestígios encontrados mostram que, com o tempo, o culto à deusa foi perdendo força. Uma das provas disso é a descoberta de uma estrutura monumental do período ptolomaico, datada de aproximadamente 200 a.C., construída diretamente sobre a antiga estrada cerimonial que levava ao templo de Wadjet — algo impensável nos períodos em que o culto era central para a população local.
Essa mudança na organização do espaço sagrado oferece pistas sobre a transformação espiritual do Egito durante os séculos finais de sua era dinástica, marcados por influências gregas e pela progressiva substituição de cultos tradicionais por novos sistemas religiosos.
Artefatos que contam histórias
A escavação trouxe à luz uma série de artefatos que ajudam a compreender melhor a cultura religiosa e funerária de Imet. Entre os destaques, estão:
- Um ushabti de faiança verde da 26ª Dinastia — estatueta funerária utilizada para servir o falecido no além;
- Uma estela do deus Harpócrates (versão grega do jovem deus Hórus), em pé sobre crocodilos e segurando cobras — símbolo de proteção contra forças do mal;
- Um sistrum de bronze, instrumento musical ritualístico associado à deusa Hator, divindade da música, fertilidade e alegria, decorado com duas cabeças da deusa.
Esses objetos reforçam a importância religiosa de Imet e mostram como as práticas espirituais estavam fortemente enraizadas no cotidiano da população.
O declínio de Imet e sua redescoberta
A cidade de Imet teve seu auge entre o Novo Império (1550–1069 a.C.) e o período ptolomaico, mas começou a declinar gradualmente após a redução do culto à deusa Wadjet. Com a ascensão do cristianismo e posteriormente do islamismo, muitos centros religiosos do Egito Antigo foram abandonados ou reutilizados com novas funções, o que possivelmente contribuiu para o esquecimento de Imet por quase dois milênios.
A redescoberta só foi possível graças ao uso de tecnologias modernas de geolocalização e ao trabalho multidisciplinar de arqueólogos, historiadores e especialistas em imagem por satélite.
Por que essa descoberta é tão importante?
Segundo os arqueólogos envolvidos, Imet é um dos achados mais significativos dos últimos anos porque desafia antigas suposições sobre o desenvolvimento urbano no Egito. Enquanto o foco tradicional da arqueologia egípcia se concentra em monumentos grandiosos como pirâmides e templos faraônicos, Imet oferece um raro vislumbre da vida cotidiana — de como as pessoas comuns viviam, trabalhavam, construíam e adoravam suas divindades.
“Esta descoberta abre novas portas para a nossa compreensão da vida cotidiana, da espiritualidade e do planejamento urbano no Delta do Nilo”, disse Nielsen. “Imet está emergindo como um sítio fundamental para repensar a arqueologia do Egito Tardio.”
Impacto para o futuro da arqueologia egípcia
A revelação de Imet mostra que ainda há muito a ser descoberto sob as areias do Egito. Combinando métodos científicos modernos com a experiência da arqueologia tradicional, é possível reconstituir partes esquecidas da história humana. Mais do que uma cidade perdida, Imet se torna agora uma chave para decifrar as complexas transformações sociais, espirituais e arquitetônicas do Egito entre os séculos IV a.C. e o domínio romano.
Para estudiosos do Antigo Egito, essa redescoberta sinaliza que o Delta do Nilo ainda guarda muitos mistérios. E para o público geral, é um lembrete de que grandes civilizações podem ser redescobertas quando menos se espera.